quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Ça va, Lyon!

Resolvi aproveitar este espaço, que criei há muito tempo e está muito mal utilizado, para aceitar a sugestão de uma amigo e registrar as impressões pessoais que tive do período de 3 meses que passamos, eu e um amigo-irmão, em Lyon.

Pensei muito em como seriam estes relatos, não poderiam ser textos longos, e sendo uma longa história teria que ser dividida em partes pequenas. Também não poderia ser um relatório, quem quer ler relatório? Mesmo profissionalmente, onde relatórios são mandatórios, os gerentes que nos cobram para escreve-los não querem ler tudo, daí a importância que dão ao “resumo gerencial” que obrigatoriamente deve vir antes do texto completo – é o que leem.

Estas duas características mandatórias (o que as fazem restrições e não problemas) me levaram a decidir por uma espécie de “conto em capítulos”. 

Periodicamente, imagino semanalmente, vou largar um por aqui, não me preocuparei muito com a ordem cronológica dos relatos, daí a menção a datas se restringirá ao estritamente necessário. Afinal, o compromisso do texto é com as impressões, e elas não se amarram muito com o tempo. Vamos ver em que dá.

Como o blog permite comentários, estamos abertos aos que chegarem.

Chega de papo, mãos a obra!



–Isso nunca acontece aqui, esse engarrafamento. Deve ter havido algum acidente aí na frente. Reclamava o motorista do taxi sob o túnel de la Croix Rousse! – Não se preocupe, não tenho pressa, estou indo para casa! Respondi.

Creio que ele estava falando a verdade, pois esta foi a única vez em que fiquei preso no tráfego na cidade de Lyon. Naquele ensolarado e frio fim de tarde do dia 30 de março de 2015 me dirigia do aeroporto para o apartamento que abrigaria a mim e meu amigo de viagem, que chegaria apenas no dia seguinte, pelos próximos 3 meses de nossas vidas; tempo esse, durante o qual, tínhamos como objetivo principal estudar francês e também conhecer um pouco da cultura e do território da França. Depois de algum tempo aprendemos que não existe uma “cultura da França” por um simples motivo não existe “uma” França! Este incrível pedaço de terra em forma de hexágono politicamente constituindo um estado chamado França, e unido por uma língua comum, guarda em si várias nações com suas culturas, pensamentos, histórias e valores.

A primeira impressão da minha nova morada teve um sabor inicial de estranhamento, ao subir até o terceiro andar do velho edifício, onde ficava o apartamento, descobri que minha dose diária de exercícios estaria parcialmente garantida, cada andar equivale a 2 de um prédio moderno, nada de elevador, a desagradável aparência das áreas comuns do prédio davam a nítida sensação de falta de cuidado: – Quem será o síndico disso aqui? Me perguntei.

Ao entrar no apartamento me deparei com uma casa limpa, bem pintada e equipada. Dois quartos pequenos e com camas confortáveis, forradas com lençóis limpos, uma sala grande dotada de uma excelente mesa de 8 lugares, um sofá, duas poltronas, televisão, equipamento de som. Uma lareira decorativa, que em algum tempo no passado fora, sem dúvida, a fonte de aquecimento do local, dava um toque europeu ao ambiente. A cozinha estava equipada com equipamentos bem modernos: fogão elétrico, máquina de lavar, máquina de pratos, cafeteira, geladeira e todos os utensílios guardados e arrumados nos armários sob o balcão e também superiores, enfim todo o necessário para uma estada quão longa fosse.

O dono do apartamento me recebeu muito cordialmente e sem frescuras. Começou me perguntando: – “on peut se tutoyer”? Ao que respondi – “Bien sûr”! Não conheço uma tradução para o verbo “tutoyer”, significa tratar alguém na segunda pessoa do singular, na prática abandonar a formalidade, isto na França só pode ser feto sob autorização, o francês sempre trata e espera ser tratado na segunda pessoa do plural, é tão importante que chega a ter 2 verbos para referência: tutoyer e vouvoyer! Me mostrou as instalações, funcionamento dos equipamentos de cozinha, do sistema de aquecimento dos ambientes e do banho quente. Deu forte destaque ao sistema de coleta de lixo: no térreo havia dois latões de lixo um para lixo comum e outro para o lixo reciclável (basicamente plásticos e papéis), quanto aos vidros deveríamos juntar e depositar em uma caixa pública que ficava a uns 200 m do edifício. Esqueça um empregado fardadinho, tocando sua campainha: – Tem lixo?

Quando elogiei o sistema de coleta seletiva ele replicou: – Nosso sistema não é muito bom, não. Conseguimos reciclar em torno de 30%, é muito baixo comparado a cidade de reciclagem mais eficiente do mundo. – Tóquio? Perguntei, – Não, São Francisco da Califórnia, eles são os campeões, reciclam mais de 90% do lixo! Foi a informação que ele me deu, desconhecia este número incrível.
Me indicou ainda o ponto de ônibus que ficava bem em frente ao prédio para a direção centro e do outro lado do rio para a direção oposta – É nesse ponto que vocês pegarão o ônibus para a Alliance Française, o C14 deixa vocês bem pertinho. Me indicou os principais pontos de compras, como padarias, mercados, farmácias, estas coisas, me deixou o telefone dizendo que ligasse quando quisesse, ele ou a esposa teriam prazer em ajudar no que pudessem.

Após sua partida, fiquei sozinho no apartamento, escolhi um dos quartos, coloquei minhas malas no mezanino, os quartos eram muito pequenos, não tinham armários, os disponíveis estavam na sala. Depois fui até a varanda, não sem antes abrir uma das cervejas que ele gentilmente deixou na geladeira.

A varanda foi o coroamento da minha impressão positiva sobre o apartamento: a vista de la Saône, um dos rios formadores da península que abriga o centro da cidade de Lyon. O rio, suas pontes, passarelas (estas apenas para pedestres), as árvores da rua – só garranchos, o casario do outro lado, a calçada que fica em um nível mais baixo que a rua e bem próxima a lâmina d’água. Como já começava a escurecer a torre de transmissão de rádio vizinha a “La Basilique Notre Dame de Fourvière” estava acesa – La petite Tour Eiffel de Lyon, linda, principal referência de localização da cidade depois dos rios que a formam. Um visual extremamente agradável e privilegiado, junto veio uma primeira pontada de (Inveja? Não, hoje sei que não, admiração mesmo) em meu coração: nem um odor! Tempo depois, quando a temperatura subiu vi pessoas pularem neste rio.

– Que cidade belíssima, que local maravilhoso escolhi para passar esses meses.

Dormi maravilhosamente bem, embalado pelos pensamentos de explorar a cidade a partir do dia seguinte e pelo agradecimento: obrigado Jesus, por ter me inspirado tão bem nessa escolha.

6 comentários:

  1. O texto e as fotos estão ótimos!! Escrita clara e objetiva!!! Você sempre me surpreendendo. Agora vai virar escritor!!!
    Amei querido. Vou ler todos!!

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  2. Meu amigo já virei leitor do Blog. Vou conhecer Lyon pelos olhos, ou melhor, pelos sentidos do meu amigo. Esperando pelos próximos posts, fico aqui visitar uma região um pouco mais ao norte.
    Um abraço (PGilson)

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    1. O texto saiu incompleto. Quis dizer que gostaria de visitar Lyon e ir um pouco mais para o norte beber umas taças de Pinot Noir.

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  3. Li duas de sua memórias e amei. Uma leitura leve e descontraída. Bjos

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